A terceira Mostra Cinema dos Quilombos recebeu filmes de diversas partes do Brasil e o recorte são obras realizadas por quilombolas e aliados nas lutas, trazendo para as telas a cultura rural e urbana dos remanescentes de quilombos, que resistiram à escravidão e seguem organizados para manter seus territórios e suas tradições.
A mostra é composta por duas sessões diárias, às 16h30 e às 19h, sendo várias delas seguidas de conversas com diretores, membros da equipe, curadoras e pesquisadores. A programação conta, ainda, com um chamado para envio de trabalhos para o livro “Cinema Quilombola – Territorialidades e territórios ancestrais”. A publicação está sendo organizada por Edileuza Souza e reunirá artigos, resenhas, ensaios, entrevistas, poemas e demais textos acadêmicos, livres e literários que dialoguem diretamente com a produção audiovisual que vem sendo produzida nas mais de seis mil comunidades quilombolas no Brasil. Os autores podem se inscrever até 30 de junho no site www.cinemadosquilombos.com.br, onde estão mais informações.
No dia 17 de junho, às 16h30, acontecerá a sessão infantil “A luz dos olhos de erê”, composta pela animação Maria Felipa (a heroína da pátria), de Fernanda Santana e Marta Silva, e pelos documentários Olhos de Erê, de Luan Manzo, e Vamos em Batalha, dirigido por moradores das Comunidades Quilombolas de Cacimbinha e Boa Esperança, no Espírito Santo.
A curadoria desta edição da mostra ficou a cargo de Alessandra Brito, Florisbela Santos e Maya Quilolo. A coordenação é de Cardes Monção Amâncio. “Assistir ao cinema quilombola é uma possibilidade de mergulhar na história viva de nosso país e conhecer realidades diversas, muitas vezes inacessíveis por outros meios”, destaca Cardes.
O cinema feito nos quilombos é de extrema importância para as comunidades e para o mundo também. “As comunidades quilombolas são invisíveis para a maior parte da sociedade e do poder público. Vivem em luta constante para ter acesso aos seus direitos. Com o cinema é possível mostrar à sociedade nossa realidade. É preciso aproveitar os avanços tecnológicos que hoje estão disponíveis nos quilombos, como internet e celulares e produzir audiovisual, mesmo que não seja feito com os equipamentos mais avançados. Assim, as pessoas veem que as comunidades quilombolas existem e resistem”, enfatiza Edson Quilombola, morador do Quilombo dos Marques e que já participou de oficinas do projeto.
Para a curadora Alessandra Brito, esta terceira mostra, que será a primeira edição presencial, será bastante especial. “Estou muito alegre em ver esses filmes no cinema junto do público e dos realizadores e também com as sessões que serão feitas nos territórios”, destaca a pesquisadora. “Penso que esses filmes são importantes demais para pensarmos muitas questões que são decisivas a exemplo da luta pela terra empreendida pelos povos de quilombo, que é também uma luta pelo direito a seus modos de vida em comunidade”, completa.
Sessão de Abertura
O fazimento que a gente faz
A sessão de abertura O fazimento que a gente faz, inspirado na fala de Dirani Kalunga, traz as artes quilombolas do fazer a partir das vivências femininas em três filmes. No coser das cores que alimentam a vida em Meada Cor Kalunga (2022), no espírito de liberdade e empoderamento a partir do corpo evocado por Nicolinas (2022) e nos passos de pretas e pretos velhos em Avós do Brasil (2021) sentimos o pulsar do fazer artístico dos territórios quilombolas a partir do movimento, seja na dança de pé no chão, seja nas mãos de fazer e coser. A força de continuidade dos fazeres femininos são trazidas à luz, ao som e à imagem pela tríade de filmes nos territórios quilombolas do Quilombo do Kalunga (GO), Quilombo Vila Santa Efigênia (MG) e Quilombo de Nanã (MT).
Sessão 2
Tem Quilombo na Cidade
A sessão é dedicada ao filme Tem Quilombo na Cidade (2018), direção de Alexia Melo e Bruno Vasconcelos e apresenta o rosário quilombola que circunda, protege e encanta a zona urbana da Grande BH. O filme apresenta o debate urgente do reconhecimentos das comunidades quilombolas de Belo Horizonte e região metropolitana, cujos saberes, fazeres e vidas seguem marginalizados em função das pressões da especulação imobiliária e da urbanização da região. Os quilombos de Mangueiras, Luízes e Manzo Ngunzo Kaiango contornam com imagens seus marcos sagrados, matas e maiangas que configuram os territórios quilombolas, patrimônios vivos da cultura mineira.
Sessão 3
Raiz, luta e alimento
A terceira sessão é nutrida de muito fazer, cantoria e alimento regado nos seios das culturas quilombolas. A sessão abrange desde os fazeres próprios das casas de farinha no Quilombo de Mituaçu em Raiz, farinha, beiju (2021), de Patrícia Pinheiro, passando pela soberania alimentar e agricultura sustentável nos quilombos do Vale do Ribeira em Do quilombo para favela (2021), de Manuela Meyer e Roberto Almeida, e pela colheita brincante das crianças em Do lado de cá (2022), fruto da oficina de audiovisual na Comunidade Quilombola de Graúna (ES).
Sessão 4
A luz dos olhos de erê
A sessão infantil apresenta o brilho dos territórios quilombolas à luz dos olhos das crianças. O primeiro filme, Olhos de Erê (2020), de Luan Manzo, dá nome à sessão e nos leva para dentro do seu universo de aprendiz/sabedor das práticas ancestrais no Quilombo Manzo (MG) ao passo que Vamos em Batalha (2023), feito pelos Moradores das Comunidades Quilombolas de Cacimbinha e Boa Esperança ( ES), investiga, a partir do filme Os Saberes do Quilombo, com direito a muita andança e fruta no pé. Já Maria Felipa (2022), de Fernanda Santana e Marta Silva, convoca de maneira animada a história da xará da pequena Maria Felipa, sua ancestral guerreira Maria Felipa, da Ilha Itaparica.
Sessão 5
Terra de gente ó não
A sessão Terra de gente ó não traz o verso de Luar de Sertão, de Luiz Gonzaga, para abrir a porteira de sentimentos quilombolas profundos sobre a terra e suas gentes. Em Terra de Encantados (2020), a comunidade quilombola de Santa Rosa dos Pretos nos conta como os encantados habitam e protegem a terra e seu povo. Também como Céu, mulher quilombola de força, encheu os olhos de sua gente de força e luta antes de se encantar no coração dos moradores do talhado no filme que leva seu nome Céu (2022), com direção de Valtyennya Pires. As mulheres plantadeiras de Curiaú, território do Amapá, nos ensinam a alegria paciente do plantio, enquanto falam do manejo do cultivo em Essa terra é meu quilombo (2022), de Rayane Penha.
Sessão 6
Eles sempre falam por nós
Eles sempre falam por nós (2023), de Carina Aparecida, inspirado no poema de Luíza Sidônio, apresenta a versão longa do enredo tecido pelas matriarcas do Quilombos dos Luízes. Em meio à pressão da especulação imobiliária, elas resistem com seus saberes e memórias, cultivadas entre as frestas de luz no projeto vertical de Belo Horizonte.
Sessão 7
Onde está o umbigo?
Na sessão de encerramento da mostra, mergulhamos com Dandara, adolescente quilombola, numa trajetória sobre pertencimento no filme Vidas dos Rosário (2022), de Marcelo Lins. Em Enterrem meu umbigo no Quilombo Periperi (2022), as raízes caboclas de vaqueiros e soínhos marcam a territorialidade do Quilombo de Periperi, onde histórias familiares entrelaçam as árvores africanas e indígenas na ancestralidade quilombola.