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Desafio de equilibrar o relógio biológico com a carreira

Não há dúvida que as mulheres evoluíram e conquistaram novos papeis na sociedade, no trabalho e em vários outros campos. Tais conquistas se acompanham de mudanças sócias e culturais no papel feminino e, neste contexto, a percepção das mulheres em relação à maternidade também vem mudando em todo o mundo assim como no Brasil. Dados de pesquisas europeias e brasileiras revelam que muitas mulheres jovens não consideram a maternidade uma prioridade. Por outro lado, muitas mulheres só se sentem prontas do ponto de vista pessoal e profissional para encarar o desafio da maternidade após os 35 anos de idade. Além disso, o mercado de trabalho nem sempre acolhe aquelas que escolhem serem mães e a maternidade é um dos fatores que acentua a desigualdade salarial entre homens e mulheres. Na verdade, as mulheres da geração Z têm adiado ou desistido da maternidade em prol da carreira e da saúde mental, pois acompanharam os enormes desafios enfrentados pela geração milenial.

O adiamento da maternidade é um fenômeno mundial e resulta na queda dos nascimentos mesmo em países nos quais a natalidade é alta como Índia, China e no inclusive no Brasil. Os números publicados recentemente revelam que a taxa de fertilidade vem caindo ao longo dos anos: em 2013 era 2,0 filhos/mulher e em 2023 chegou a 1,5, sendo o valor de 2,1 considerado adequado para a substituição populacional no longo prazo. A taxa de nascimento menor que a de mortalidade configura a desnatalidade, que traz consequências econômicas e sociais desastrosas para nossa organização social e econômica assim como para os programas de previdência social.

O desafio é conciliar o novo papel das mulheres com seu relógio biológico: há uma queda significativa da capacidade reprodutiva feminina a partir dos 35 anos de idade que, apesar dos avanços da ciência, ainda não sabemos como interrompê-lo nem revertê-lo. Doenças como obesidade e endometriose, tabagismo, infecções sexualmente transmissíveis, estresse, alterações do sono e a poluição ambiental podem acelerar o declínio da fertilidade feminina. As mulheres nascem com um número fixo não-renovável de óvulos, a chamada “reserva ovariana” e, ao longo do tempo, há redução não só do número assim como da qualidade destes e o consequente declínio da fertilidade, que se acelera após os 35 anos. Assim, aos 41 anos as chances de infertilidade podem chegar a 50% aos 41 anos e 90% aos 45.

Muitas pensam que podem adiar a gravidez confiando nos avanços da ciência e das técnicas de reprodução assistida como a fertilização in vitro (“bebê de proveta”) para ajudá-las a alcançar a maternidade quando assim o quiserem, o que nem sempre é possível. Apesar dos avanços tecnológicos, a idade feminina ainda constitui o principal fator para as chances de gravidez. Realmente, muitas mulheres conseguem engravidar espontaneamente após os 35 anos e os dados do IBGE revelam que aumentou em 56% o número de partos nas mulheres de 35 a 39 anos. Entretanto, não há até o momento nenhum método capaz de medir com precisão a reserva ovariana muito menos a chance real de engravidar e ter um filho saudável. Assim, é vital reconhecer os limites biológicos e a educar da população e os profissionais de saúde de modo que as escolhas reprodutivas sejam livres e esclarecidas.

É possível realizar de exames hormonais que conjugados com a idade da mulher e a ultrassonografia podem revelar alterações da reserva ovariana, mas não há como reverter a perda. Neste contexto, a preservação da fertilidade através do congelamento de óvulos surge como opção para aquelas que, por várias razões precisam adiar a maternidade. O procedimento preferencialmente deve ser feito até os 35 anos para obtenção dos melhores resultados. Não há um consenso sobre quantos óvulos devem ser congelados, mas acredita-se que entre 10 e 15 seria o número adequado para permitir uma chance de ter um filho de até 70% em mulheres com até 35 anos. O congelamento de óvulos também pode ser usado para preservar a fertilidade de mulheres previamente a tratamentos oncológicos.

Parece claro que a necessidade de abordar e discutir o planejamento reprodutivo decorre de seus efeitos em nível pessoal, bem como das consequências sociais e econômicas da redução das taxas de fertilidade. Dessa forma, apesar de todos os avanços da ciência e da tecnologia, a decisão de ser mãe não pode ser adiada indefinidamente. A maternidade, se desejada, deve ser discutida e planejada de modo a permitir uma gravidez sem complicações e o nascimento de crianças saudáveis. Além disso, como é preciso dar às mulheres a oportunidade real de conciliar a carreira e a maternidade se assim o quiserem.

A autora é Márcia Mendonça Carneiro, Ginecologista do Biocor /Rede D’Or, Professora Titular- Departamento de Ginecologia e Obstetrícia – Faculdade de Medicina da UFMG

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