Está no ar a plataforma editorial Elas Escrevem com diversos escritos sobre as vivências e aprendizados a partir da maternidade e suas múltiplas formas, redigidos por autoras de diferentes realidades – territorial, econômica, social, racial, cultural, de gênero –, nascidas entre os séculos XIX e XXI. Atualmente, o portal abriga textos com narrativas sobre a escolha de ser ou não ser mãe, a chegada dos filhos, o aborto, o puerpério, o sexo, entre outros. As publicações são assinadas por brasileiras, mas também por mulheres de outros países, como Argentina, Chile, Canadá, Estados Unidos, Dinamarca, Portugal, Itália, Hungria, Austrália, Guadalupe, Antígua e Barbuda, Colômbia, México, Moçambique e Nigéria, África do Sul e República da Coréia – todas traduzidas para o português e disponíveis gratuitamente. O endereço de acesso do site é www.elasescrevem.org. “ Este projeto é realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte.
“Desde a sua criação, o ‘Elas Escrevem’ tem se tornado um espaço de leitura e consulta de referências sobre o tema da maternidade e, por isso, contribui, atualmente, como um espaço de pesquisa para pessoas interessadas”, explica uma das curadoras do Portal, a editora Maria Carolina Fenati.
Mas nem sempre foi assim. Quando surge, em 2018, a proposta é, sobretudo, ser uma plataforma para o acolhimento de textos que as mulheres porventura tenham escrito, sem todavia, publicá-los. E mais do que isso: “ser uma plataforma para incentivar mulheres a experimentarem a escrita sobre a própria experiência ou a experiência de outras. Uma aposta na escrita e na partilha das palavras como forma de acompanhar e elaborar a maternidade na variabilidade das suas formas”, conta a editora, que também é mãe da Maria (7 anos) e Sara (6 anos).
Na época, Maria Carolina se recorda que o mercado editorial, no Brasil, começava a ser ampliado com o aparecimento de diversas publicações e traduções sobre o assunto. A editora, ao lado de outras duas criadoras do portal Fernanda Regaldo e Cecília Rocha – que também haviam se tornado mães recentemente –, percebem que a plataforma nasce com um diferencial: ser um espaço de escrita, pesquisa, pensamento e partilha sobre o tema, mas que trouxesse uma abordagem distante do ideal da maternidade como destino biológico ou como símbolo da realização feminina.
“Percebemos que faltavam espaços em que pudéssemos nos expressar e nos ver narradas. Ou ainda, textualidades nas quais possamos transpor o contraditório que marca nossas experiências subjetivas para um campo mais amplo em que nos encontremos juntas e representadas: as que são mães, as que não são, as que se sentem, as que não querem, as que não podem, as que têm útero, as que não têm, as que desejam, as que buscam, as que questionam, as que tentam, as que resistem, as que cuidam, as filhas – é para todas e cada uma que esta plataforma se destina. É como se nos lêssemos para nos reconhecermos na palavra”, comenta a editora Fernanda Regaldo.
Muitas publicações do Portal surgiram de oficinas de escrita sobre maternidade ministradas pelo trio de editoras. Ao final, as alunas saíam com um texto revisado – alguns deles eram publicados no Portal. “Com o tempo, e a existência de uma imensa rede de mães em todo o mundo, fomos, aos poucos, recebendo também publicações de outros países e passamos a editá-las e publicá-las no Portal. Com isso, o ‘Elas escrevem’ foi incorporando novos territórios, línguas, modos de narrar e formas de experienciar a maternidade ”, lembra Maria Carolina Fenati.
Segundo as editoras, apesar dessa expansão nos últimos anos, ainda há narrativas que participam com menos força no Portal. “São muitos os textos escritos por mulheres heterossexuais e brancas, e muito menos por mulheres negras, ainda menos por mulheres trans. Entre os assuntos tratados, há mais textos sobre a gravidez e o puerpério, e menos sobre a sexualidade feminina depois da maternidade, ou sobre o luto pela perda dos filhos. Por isso, o trabalho editorial do portal é também o de buscar estas narrativas menos visíveis e publicá-las, colaborando para radicalizar a variedade do que entendemos por maternidade”, comenta Carolina. A editora acrescenta que “climatério, perimenopausa, vida sexual e o cuidado com os pais estão entre os temas que poderiam ser mais explorados na plataforma, e que merecem atenção”, completa.
Parte das mulheres publicadas no Portal não são escritoras profissionais. Para participar, basta enviar o texto que pretende publicar para ser avaliado pela equipe curatorial do Portal Elas Escrevem, pelo e-mail [email protected]. A proposta do portal é colaborar para a democratização do acesso à escrita e à leitura e, portanto, todas – tendo ou não experiência anterior de escrita – são incentivadas a enviarem suas propostas.