Nos últimos dias, feminicídios vêm causando comoção nacional, devido à brutalidade dos crimes. Ex-companheiro coloca fogo na casa, mata a mulher e os quatro filhos do casal, com idades entre 1 e sete anos, em Pernambuco. Duas mulheres foram assassinadas por um colega de trabalho que não aceitava ser chefiado por uma delas. Esses são exemplos da média de quatro feminicídios consumados por dia no país.
Ainda há 15 tentativas de feminicídios diariamente no Brasil, deixando as vítimas com sequelas físicas e emocionais, como é o caso da mulher atropelada e arrastada pelo ex-companheiro, por um quilômetro na Marginal Tietê. Ela teve as pernas amputadas devido à gravidade do acidente e está internada na UTI.
A advogada e pesquisadora Dra. Fernanda Las Casas, doutora em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP) e presidente da Comissão Nacional de Pesquisas do Instituto Brasileiro de Direito da Família (IBDFAM), enfatiza que as leis que endurecem as penas por feminicídio ajudam, mas não são a solução para o combate ao crime, já que o número aumenta ano a ano. Ela alerta que para diminuir o crescente número de violência contra a mulher e de feminicídios é necessária uma reestruturação cultural que desconstrua a violência na base, desde a formação de meninos e meninas. Essa solução foi encontrada em suas pesquisas para a tese de doutorado pela USP, que foi editada no livro “Família: mitos ancestrais e crises da maternidade”.
Para Dra. Fernanda Las Casas, os mitos ancestrais da virilidade (de que os homens naturalmente fortes, corajosos,
violentos e viris) e da maternidade (de que as mulheres nasceram para maternar, e se apresentam como frágeis, dóceis, voluntariosas e indefesas) vêm formando padrões sociais (estereótipos) que estão levando a sociedade a um destino sem precedentes, com um número de feminicídios e de encarceramentos masculinos cada vez maiores.
Ela explica que, assim como as mulheres são treinadas para submissão, atividade de cuidado e da maternidade, os homens também são treinados a esterilizar todos os seus sentimentos, sejam de frustração e de tristeza ou de alegria, através da violência. “Para a sociedade patriarcal, os homens não podem externar seus sentimentos. Muitos encontram na violência uma forma de falar sobre si, exteriorizar qualquer sentimento, porque foi isso que aprenderam. Isso também explica por que na sociedade atual, onde vivemos tantos desamparos financeiros, insucessos e frustrações, tem aumentado o número de feminicídios. Homens são treinados para serem violentos e mulheres treinadas para obedecerem e acabam sendo assassinadas por eles”, esclarece a pesquisadora.
Para obter os resultados esperados, como o desaparecimento da violência doméstica, é imprescindível começar as modificações imediatamente e reestruturar a cultura iniciando pelo ensino básico, alterar legislações misóginas, refazer os padrões estabelecidos em virtude de gêneros, para que as novas gerações compreendam que todos devem participar e são integralmente responsáveis pelo cuidado das formações familiares. “Se a família é a base da sociedade, essa base não pode continuar recaindo exclusivamente sobre a mulher, sem a divisão de tarefas de cuidado e a riqueza também distribuídas de forma justa e solidária, compartilhadas de maneira equitativa”, finaliza a pesquisadora e advogada Dra. Fernanda Las Casas.
Dra. Fernanda Las Casas
Advogada e pesquisadora em Direito de Família e Sucessões. Doutora em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP), Mestra em Função Social do Direito pela Faculdade Autônoma de Direito (FADISP) e Especialista em Direito de Família e Sucessões pela Escola Superior de Advocacia (ESA/SP).
Professora de Direito Civil, Digital, Bioética e Família nos Cursos de Pós-Graduação do EBRADI, da Universidade Estadual de Londrina – UEL, Curso Damásio e Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil.
Autora do livro “Família: mitos ancestrais e crise da maternidade”, da Editora Foco, fruto da sua tese de Doutorado pela USP.
É coautora em 18 livros, sendo coordenadora em 3 e organizadora em 1.
Presidente da Comissão Nacional de Pesquisa do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).